Sertão, Julho de 2018
Sertão,
Julho de 2018.
Ida
e volta ao sertão da Paraíba de ônibus, de Campina Grande a
Marizópolis, sete horas de viagem; ônibus confortável, com ar
condicionado, mas pára muito, um sobe e desce; e checagem de
bilhetes de passagem, e põe e tira malas, nesse ritual por toda
estrada. Em quase todas cidades o ônibus pára nas rodoviárias.
Raramente os banheiros estão limpos ou têm papel higiênico ou
sabão para lavar as mãos. Quando paramos para refeições ficamos à
mercê das escolhas dos motoristas dos ônibus que devem se
beneficiar com refeições grátis; mas nem sempre resulta na melhor
alternativa para os passageiros. Quatorze horas no total, ida e
volta. Eu tinha livros para ler mas resolvi olhar a irresistível
paisagem, acompanhar a cordilheira azul, que vem dos lados do Ceará
e que parece dividir os Estados de Paraíba e Pernambuco, que se
estende preguiçosa e bela margeando a estrada à distância, em todo
percurso, até a Serra da Borborema. Bela geografia, com efeito,
contrasta com a geopolítica.
Como
nasci, no Sítio Carnaúba, olhando aquela serra, certa vez inventei
uma estória que tinha como protagonista a serra azul. Foi assim:
vieram uns compradores de bois para abate de Marizópolis, negociar
os animais com meu pai, entre eles havia dois meninos, mais velhos do
que eu. Eu contei para aqueles meninos que eu tinha um cavalo que
corria sobre a serra, a toda velocidade, por cima de queimadas, por
cima das cinzas, sendo que de vez em quando era encoberto pela
fumaça. Os meninos me olharam incrédulos, espantados e desconfiados
de minha fantasia. Alguns anos mais tarde fui morar na Vila e lá
encontrei esses mesmos meninos, que não esqueceram da minha estória,
e caçoaram de mim; não me davam trégua, me chamavam de beiradeiro
(quem mora nas beiradas: os fazendeiros, os sitiantes).
Contavam para os outros meninos a estória que eu lhes havia contado;
era certamente um tipo de “bullying.”
A
vegetação do sertão semi-árido é quase toda de árvores
pequenas, quase rasteiras: juremas, mufumbos, marmeleiros; aqui e
acolá árvores grandes tais como: juazeiros, angicos, raros pau
d'arcos, carnaubeiras; das fendas dos lajedos brotam as macambiras
vaidosas, como se mostrassem que são resistentes as adversidades. Os
xique-xiques e os mandacarus são vistos também em outras regiões
da América do Sul e do Norte, principalmente no México e no deserto
dos Estados Unidos (como cactus); mas aqui adquirem qualidade e
cenário imbatíveis para caracterizar nosso sertão nordestino.
A
TV e os jornais quase sempre mostram o sertão nordestino na pior
situação, não o mostram quando este está verde, florido,
plantado, após as chuvas; a mim parece que o interesse da imprensa
(com raríssimas exceções) é mostrar sempre o pior: esqueletos de
animais, matas e açudes secos, sertanejos relatando miséria e
comendo ratos. É claro que a realidade deve ser mostrada, mas
mostrem também, à guisa de justiça, quando o sertão está
molhado, verde; de qualquer forma o sertão é sempre belo e ele fica
sempre lá para quem quiser ver.
Como
dito, o sertão é lindo quando chove, a vegetação cresce
rapidamente, tudo fica verde, como se tivesse pressa em se exibir,
por não saber quando outra chuva virá.
Passamos
por várias cidades onde os moradores de quase todas as casas
costumam plantar árvores frutíferas nos quintais: coqueiros,
bananeiras, cajueiros, goiabeiras, mangueiras, etc. Este ano houve
volume razoável de chuva. Nota-se pela quantidade de lagoas,
pequenos açudes, barragens, à beira da estrada quase todos ainda
com água e pelos capins amarelados, acarminados, coloridos pela ação
impiedosa do sol.
Fico
pensando se o sertão tivesse chuvas regulares; se a Serra da
Borborema deixasse as nuvens carregadas passarem; a história do
sertão certamente seria outra.
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