B.O.


B.O.

Naquele dia Jonas se dirigira em torno das nove horas à delegacia de polícia do bairro onde mora. Fora fazer um B.O.(Boletim de Ocorrência). Imaginara que ia ficar lá muito tempo a esperar, (porque era assim o normal), para ser atendido. Para aproveitar o tempo levou um jornal do dia e um livro. O gerente do banco onde ele era cliente pediu-lhe que fosse a uma delegacia de polícia e desse queixa dos saques ocorridos em sua conta, sem seu conhecimento e consentimento.
Ao contrário do que previra, fora atendido rapidamente, nem dera tempo de abrir o jornal ou o livro.
Uma senhora que devia estar beirando os sessenta anos o chamou e pediu-lhe para sentar-se à sua frente, à uma mesa daquelas que parecem ser alugadas; com toda aquela feiura de móveis muito usados e sem manutenção. Ela, de cabelos pintados de loiro, batom vermelho, sobrancelhas um pouco arqueadas e mais escuras que os cabelos; todos os dedos da mão esquerda com anéis imitando ouro, sendo que no anular havia dois anéis; de vestido preto com umas bolinhas pequenininhas e brancas; era alta e tinha o corpo reto, quase sem curvas; sapatos altos, com uma fivelinha na alça, acima do calcanhar; o vestido valorizava bastante seu busto, pois o exibia através do baixo decote, seus seios generosos, cheios de pintinhas de sardas; havia menos sardas em seu rosto, porém nos seios era como uma constelação de estrelas.
Ela percebera que Jonas olhava disfarçadamente, pelos cantos dos olhos, os seus atributos físicos, com efeito, ela parecia sentir-se orgulhosa e vaidosa. Afinal, se os estava mostrando era para serem vistos, assim ele pensava.
Ela começou a redigir o B.O., mas de vez em quando fazia perguntas a sua colega, sentada à mesa ao seu lado; que, embora muito mais jovem, parecia ser mais experiente.
Enquanto o B.O. era redigido, com as informações dadas por Jonas, ele ouviu algumas histórias de outros casos que rolavam na delegacia:
A escrevente da mesa ao lado estava atendendo a queixa de uma senhora, de estatura média, magra, morena-clara, parecia ter trinta e cinco anos, bonita, falando português correto e claro; queixava-se de uma vizinha que jurara jogar água em sua filha. Ela queria que a escrevente mencionasse no B.O. que a água poderia ser quente. A escrevente perguntou: “sua vizinha disse que ia jogar água quente em sua filha?” A vítima respondeu: “não, ela disse que ia jogar água.” A escrevente disse: ”então não posso mencionar a temperatura da água no B.O.” Porém a vítima queria um B.O. de acordo com seu desejo; ela queria ditar os termos do B.O., mas a escrevente não aceitou. Essa senhora insistia, dizendo que a escrevente tinha obrigação fazer o que ela estava pedindo. Aí ela disse que ia falar com o delegado e a escrevente disse: “está bem, a senhora pode sentar-se ali (e apontou o lugar) e esperar por ele; ele ainda não chegou.” A vítima fez o que a escrevente mandara e, ato continuo, ligou o celular, aparentemente, para falar com seu advogado.

Outro caso que Jonas ouviu, foi o de uma senhora de mais ou menos quarenta anos, bem vestida de terninho bege, loira, alta e de olhos verdes-claros, gerente de RH, que teve seu carro roubado e quase fora sequestrada junto; o bandido encostou o cano do revolver em seu ouvido e queria que ela passasse para o banco do carona. Ela negociou naquele curtíssimo espaço de tempo, que parecia infindáveis horas, para ele levar só o carro e lhe devolvesse a bolsa que estava sobre o banco do carona, enfatizando que só tinha documentos; contudo, havia também um celular. O bandido aceitou lhe entregar a bolsa, porém antes abriu a mesma, tirou e levou celular.

A senhora loura, a escrevente, pediu que Jonas lesse o B.O., ele leu e pediu-lhe para fazer uma pequena correção e ela o fez, imprimiu, os dois assinaram. Ele recebeu sua via, agradeceu o bom atendimento (o que nem sempre acontece) e se dirigiu ao banco.

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