A vila

A vila

Esta semana lembrei-me da calma que reinava em Marizópolis quando era uma Vila, das ruas poeirentas e sem nomes que mais pareciam cenas de cidades do faroeste americano; ruas nomeadas e numeradas anos mais tarde por vereadores, quando fora emancipada de Sousa, com nomes de pessoas que conhecêramos e insistentemente ditas fundadoras. Salvo algumas brigas de bêbados, de marido e mulher, era tudo tranqüilo: “você é um corno convencido”, disse alto e em bom som que atravessou a vila como um cometa, de canto a canto, uma mulher pega em flagrante por seu marido, em plena madrugada e tiros disparados para cima, pelo marido, talvez para justificar o “corno convencido”.

Meus pais sentavam nas cadeiras de balanço, trançadas por “macarrãozinhos” , cantavam uma das músicas que gostavam:“Emília” de Roberto Silva:

Eu quero uma mulher
Que saiba lavar e cozinhar
E de manhã cedo
Me acorde na hora de trabalhar
Só existe uma
E sem ela eu não vivo em paz
Emília, Emília, Emília
Eu não posso mais ….............


(E assim iam cantando esses versos e outros até inocentes e cheios de amor. Ainda, felizmente, não se falavam em letras de músicas machistas. A história tem que ser preservada e não proscrita).

Chagas Braga (nosso primo) andante inveterado, movia-se pelas ruas escuras, lá pelas quatro de todas manhãs; via-se aquele vulto de longe e o homem a poucos passos ia fazendo-se reconhecer, fazendo-se revelar: de cabelos pretos, penteados pra trás, sobrancelhas taturanas, olhos grandes, bigode fininho, estatura média. Dizia com sorriso largo que estava tudo bem e que já tomara seu café, que ele mesmo coara em um bule de ágda azul, desenhado com flores, enquanto a mulher e os filhos dormiam.

Os quiosques perto do Mercado Municipal já davam sinais de que havia ovos fritos com cuscuz de milho, tapioca com manteiga da terra, bife de fígado acebolado, até sarapatel, para o café da manhã. Sim, comia-se no café da manhã alimentos do almoço, e ainda come-se.

O cheiro de pão assado da padaria de dona Iracema já impregnava o ar e os primeiros raios de sol projetavam-se sobre as nuvens esparsas várias cores que via encantado o espectador, daqui de cima da serra “Pedra Talhada”.

 

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