Reunião


Reunião

Em uma época em que a dedicação, a disciplina, a honestidade, a lealdade, um pouco de técnica, pesavam na avaliação para o crescimento de um empregado, em nível de gerência, dentro de uma organização, o senhor Ulisses, nesse contexto, atingira uma posição de destaque dentro daquela empresa, como gerente administrativo e financeiro, era um bom cargo, ambicionado por muitos; Ulisses tinha em torno de cinquenta e cinco anos.

Por outro lado, já havia indícios que a eficiência, a habilidade de entregar bons resultados, e de percorrer os meandros da hierarquia, nem sempre muito honestos, mas políticos, para atingir objetivos, já clareavam no despontar dos anos oitenta; nesses quesitos se enquadrava o senhor Trajano, que era assessor, mas sabia-se que um dia iria ocupar importantes posições. Trajano tinha máximo de 35 anos. Dava a impressão que ele era recalcado devido sua baixa estatura de em torno de um metro e sessenta, meio a muita gente alta naquele departamento; devido a isto, procurava compensar essa “desvantagem” com outras atitudes, nem sempre simpáticas.

Outro perfil dentro das organizações naquela época era os empregados com o perfil de Ulisses, porém muito técnicos. Embora fossem muito úteis às organizações, não sabiam muito lidar com a política (pode-se dizer também com a bajulação) e o jogo de cintura. Com esse perfil havia alguns, posto que as empresas também precisam dessas abelhas ou formigas operárias para fazerem o trabalho e darem sustento aos níveis hierárquicos mais elevados. Nesse perfil havia muitos, e se encaixava Leônidas, que era quieto, educado, confundido, devido a esse perfil, com um empregado que não deveria assumir posições de liderança.

Após uma reunião tensa, com uns oito participantes, Ulisses convidou Leônidas, de quarenta anos, para dar uma volta na fábrica, beber um refrigerante (que ele chamava de refresco) na cantina e saber sua opinião sobre o que acontecera na reunião de hoje. Na reunião, Trajano que era assessor do controller geral, com o dever de cobrar a solução de vários problemas, conforme check list que tinha em mãos, baseados em relatórios da auditoria, o qual apontara várias providências a tomar. Ao cobrar o andamento de determinado trabalho, teve mais uma resposta evasiva; por causa disso, discutira com Guilherme, que era de temperamento agressivo e que não gostara de ter sido cobrado daquela forma que jugara autoritária. Na discussão Trajano encarou Guilherme e disse que “a porta da rua é a serventia da casa”. Guilherme entendeu o recado e engoliu com dificuldade a saliva com gosto de fel; levantou-se e saiu, e a reunião continuou com o restante dos participantes, com um ar mórbido, como o de um velório. Os participantes só falaram o estritamente necessário.

O senhor Ulisses perguntou: “ Leônidas, o que você achou do desfecho de nossa reunião?” Leônidas dera a mesma resposta que dera a Trajano cuja ação, imediatamente após a reunião, esgueirara-se em inquirir Leônidas com a mesma indagação. Leônidas disse que “foi lamentável, um desgaste que poderia ter sido evitado.”
O senhor Ulisses disse: “Como poderia ter sido evitado?” Leônidas respondeu: “caso Trajano tivesse conversado com Guilherme antes, para saber o andamento daquele item.”
É, você tem razão, disse Ulisses.”
Agora, por que o Trajano quis saber a opinião de Leônidas antes da opinião dos outros? Porque julgava que Leônidas fosse amigo de Guilherme. E passou, com ênfase, a achar isso. Por não se entender com Guilherme, também não considerava seus amigos.
Leônidas foi para outra divisão de produto, mas Trajano ainda continuou influindo em suas avaliações de desempenho anuais, como se fosse marcado para não alcançar postos altos.

Trajano também mostrava-se invejoso. Depois que Leônidas fora para outra divisão de produto, teve que fazer uma viagem para a sede dessa divisão na França, para se inteirar de como eram feito controles e custos dos produtos. Pois quando Leônidas foi retirar o bilhete de passagem aérea, no departamento de viagem encontrara Trajano no elevador, que não dera nenhuma atenção ao Leônidas, nem mesmo olhou para cara dele, tampouco desejou-lhe boa viagem.



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