Ayres
Ayres
Costumava ir a uma associação de ex-funcionários de uma empresa que trabalhei muitos anos, em um local muito bem situado na Vila Mariana. Lá encontrava ex-colegas, ouvia as histórias, estórias e até fofocas. Numa dessas vezes encontrei Antonio Ayres, um descendente direto de portugueses, meu xará.
Eu iniciei a conversa, entusiasmado:
Oi xará, há quanto tempo, hein !
Como vai, etc. Esses inícios de conversas de elevador.
Rapaz, tudo bem, respondeu ele, com exceção de algumas mortes.
- O quê?
- Sim, e de gente que trabalhou diretamente com você.
- Lembra do André, aquele rapaz educado, alto e de boa pinta?
- Lembro, lógico.
- Morreu.
- Não me diga isto, Ayres.
- Ele se matou.
- Caramba Ayres, um cara tão novo.
- A gente não sabe o que passa na alma das pessoas, é um mistério.
- Sabe de outro que morreu?
- Não.
- Almeida.
- Não me diga, o ferramenteiro?
- Sim, foi receber um aluguel atrasado, o inquilino não pagou. Só foi a hora de chegar em casa e morreu de infarte, caiu duro e preto.
- E a moça do caixa?
- Aquela morena?
- Sim, ela mesma. Morreu.
- Bom ela já tinha uma certa idade, né Ayres?
- Sim, mas ninguém esperava, parecia saudável.
- E seu ex-chefe?
- Não venha me dizer que ….....?
- Sim, morreu.
Comentei: ele parecia um tocador de Bandoneón, né? Com aquele cabelo preto, repartido, bem cortado, brilhante. Também podia fazer o papel de um toureiro ! Jogava tenis, gente fina.
- Pois é.
Ayres, desse jeito só sobramos nós!
Não sei por quanto tempo.
Ayres, vire essa boca pra parede!
Até a próxima Ayres e da próxima vez, por favor, boas notícias.
Ele saiu andando a passos largos e compassados, como se estivesse remando, como fazia meu tio Pedrinho Lins nas águas do Açude de São Gonçalo; e ele com um jornal dobrado, no bolso de traz da calça, acompanhei-o até perdê-lo de vista.
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