O Gerente Geral

O gerente geral da fábrica era um holandês robusto de corpo e de experiência. Era alto e largo, de pele avermelhada e cabelos louros, caindo sobre a testa, cuja  cor se assemelhava a alfenim. Já havia passado por várias fábricas da empresa no mundo, inclusive na China. Sua primeira providência, quando assumiu a direção dessa última planta, foi mandar pintar todas as portas de vermelho, em homenagem ao país asiático onde trabalhara, e também fora uma maneira de marcar território, como fazem os gatos.
Implantou na fábrica uma filosofia de trabalho que todo empregado tinha de se comprometer a seguir, que consistia em fazer um bom trabalho, em todos os níveis hierárquicos, do gerente ao faxineiro, sem exceção, objetivando um trabalho sem nenhum defeito. Erros eram inevitáveis mas o empregado tinha a obrigação de rever e aprimorar o esquema defeituoso para não mais errar; usando um processo de feedback.

Avisou aos gerentes, aos chefes, que gostava de conversar e discutir os relatórios, cálculos, diretamente com quem fazia esses trabalhos; gostava de ver os rascunhos, poderia ser com o menor nível da hierarquia. Dizia que os chefes filtravam as informações e as explicações para falar com ele, por isto dava preferência a pedir instruções de quem executava o trabalho. Muitos chefes ficavam enciumados ou preocupados com as críticas que ele poderia fazer.
Também fazia elogios, em reuniões, quando encontrava um trabalho bem feito e citava o nome do autor do trabalho.

Fazia reuniões mensais, com todos os gerentes para analisar os resultados e cobrava de cada um melhora nos processos. Ele dizia que sempre teria como melhorar um trabalho. "Façam revisões, sempre há como melhorar.", dizia.

Certa vez, numa das reuniões com os gerentes ele achou um erro no trabalho de um deles. Aquele gerente estava sentado na primeira fileira, na fileira do gargarejo. O gerente geral apontava o quadro, com uma espécie apontador de uma antena telescópica usada em carros. Quando viu o erro, sabia quem o cometera. Era de um gerente de cabelos pretos, bem penteados e brilhantes, parecendo os cabelos de um tocador de bandoneon argentino ou, se quiserem, de um toureiro espanhol, penteados e repartidos ao meio. O gerente geral encostou a antena-apontadora na cabeça do gerente, fazendo um gesto, como se batesse em sua cabeça, todavia, tocou levemente em seus cabelos; os outros gerentes riram, entretanto, levaram aquele episódio como uma brincadeira, mas o gerente que fez o erro não gostou, saiu da reunião emburrado. A reunião acabou na hora do almoço e todos foram para a cantina almoçar, com exceção do gerente que fora advertido; este fora diretamente para sua sala. No início do segundo expediente, apareceu um holandês que vivia no Brasil há muito tempo, nascido em Suriname, de pais holandeses; inclusive casara com uma brasileira e todos os filhos também eram brasileiros. Este entrou na sala do gerente levando consigo um capacete. Colocou esse item do EPI sobre a mesa do gerente e disse: "para você usar na próxima reunião." O gerente, irritado, pegou o capacete, devolveu-o para o holandês e disse: "leva isto de volta, saia de minha sala." E apontou a porta. O holandês saiu da sala rindo, sem graça!

Na cantina,  orientava os empregados se servirem  à vontade, entretanto, não deviam deixar sobras de comida no prato; fazendo-os lembrar que em nosso país muitos não tinham o que comer, por esta razão não tínhamos o direito de desperdiçar.

Fazia jantares em sua casa e convidava os gerentes e as esposas destes. Gostava de dançar e muita mulher se escondia para evitar de dançar com ele; outras, achavam que ajudavam os maridos, dançando com o chefe deles; mas as que o evitavam não tinham como enganá-lo sempre; uma hora ele iria fazer o convite e puxá-las pelo braço, para dançar com a fujona. Ele dançava desajeitado, misturando samba com rumba. Incentivava sua esposa a dançar com os convidados. Ela entrava para dançar meio sem jeito, com o corpo comprido, fino e delicado como uma taça de champagne, requebrava os quadris com a cintura dura. Observava as brasileiras de quadris generosos, e de movimentos sensuais, que parecia que só as latinas tinham o direito de ter.

Como não falava Português direito, reservara uma hora com sua secretária para ter lições da língua seguindo um livro de gramática adotado em Portugal. A secretária paciente, dizia que algumas palavras não eram usadas no Brasil, mas ele teimava em usar aquele manual.

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