“Em rio que tem piranha jacaré nada de costas!”


Em rio que tem piranha jacaré nada de costas!”

Na adolescência de meus tempos, eu também praticava algumas atividades impensadas; hoje, só de me lembrar, causa-me arrepios. O pior de tudo é que muitas vezes eu fazia aquelas traquinices, irresponsabilidades, sozinho e tive a sorte de nunca ter-me machucado. E, como dizia Zeca Diabo, “minha santa mãezinha” não sabia nada. Eu era um James Bond, às avessas, comedor de canapu; sem saber ainda da existência de Ian Fleming, o escritor; dado que os filmes com o famoso personagem viriam depois.

Algumas das travessuras arriscadas:


Quando Marizópolis era iluminada por um grande motor e um dínamo gerador de energia elétrica, ao lado do prédio onde a máquina fora instalada havia uma cisterna com água para refrigerar a temperatura do enorme engenho. Era um grande tanque cheio de água, que devido a profundidade a água era turva, não dava para ver o fundo, e havia um pouco de óleo na superfície, posto que a água após passar pelo motor, era devolvida para à cisterna, em um processo de alimentação e retorno, com funcionamento semelhante ao radiador de um veículo. Pois eu costumava entrar naquele tanque e mergulhar para me refrescar do calor. A água era fria e envolvente. Não sei como eu entrava para acessar a cisterna pois a porta da frente era trancada com cadeado; sei que havia uma escada de madeira dentro do quintal ou do que chamávamos de “muro”, que eu a utilizava para alcançar o tanque.

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Na estrada para Sousa, antes de chegar em São Gonçalo, há um túnel que passa por baixo da estrada, com água que se estende até um braço do açude. Costumávamos nadar ali. Muitas vezes voltando de bicicleta de São Gonçalo eu resolvia parar e tomar um banho na água fresca, tirar o suor, e seguir minha viagem de volta para Marizópolis. Certa vez eu estava sozinho, estacionei minha bicicleta, despi-me, entrei na água, comecei a nadar com a intenção de atravessar o túnel, em direção ao açude. Quando estava mais ou menos no meio do percurso, vi uma cobra que nadava em minha direção, daquele tipo de cobra conhecida como cobra d'água. Voltei nadando rapidamente para o local onde eu entrara, sai da água incontinenti, vesti-me, fui pedalando a bicicleta, arrependido da besteira que eu fizera.

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Quando o açude de São Gonçalo estava sangrando, o excesso de água, às vezes alto, precipitava-se parede abaixo até atingir as pedras erodidas do Rio Piranhas. Ali qualquer descuido poderíamos cair para nunca mais voltar vivo; era um perigo. Pois costumávamos pular da parede mais alta, e cair bem próximo ao sangrador.

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Por essa época também não havia água encanada. A água para consumo da casa, para encher os potes de barro, para beber; reabastecer a caixa d'água para tomar banho, era transportada em ancoretas presas em cangalhas no lombo de jumentos. Fazíamos várias viagens de ida e volta ao açude, tangendo os jumentos. Na última viagem ficávamos algum tempo tomando banho e apostando quem nadava mais rápido, quem atravessava o braço do açude e voltava em menos tempo. Era um local onde muitos de nós aprendíamos a nadar. Atravessávamos aquele braço de açude nadando nus. Havia muita piranha que poderia nos morder, tirar pedaço de nós, deixar-nos incapazes pelo resto da vida. Não sabíamos que “em rio que tem piranha jacaré nada de costas!”


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