Maximiliano

Maximiliano estacionou seu carro em frente a uma loja de roupas. Observava uma mulher enquanto bebia uma lata de cerveja gelada, comprada minutos depois de estacionar, em um supermercado. Aparentemente a mulher esperava o marido pois falava ao celular, gesticulava, como se dissesse: “estou lhe esperando aqui no estacionamento, não demore” e deve ter dado mais detalhes, pelos gestos mostrados e o tempo que falava; às vezes ria, às vezes franzia o cenho. A mulher foi melhor observada por ele, em detalhes, quando ele entrara no supermercado. Era alta, morena e bonita, muito feminina, “qualidade que aos poucos torna-se rara hoje em dia”, balbuciou baixinho entre os dentes alternando um gole e outro da cerveja. Ela perecia ter tido filhos porque seus quadris eram um pouco mais largos, o que para o Maximiliano era um "bonus", gostava de mulheres maduras. Ainda dentro do supermercado viu que ela o olhou discretamente por cima do ombro direito, enquanto lia o rótulo de um produto. Ele se encheu de orgulho, estava carente por não fazer muito tempo da separação de uma mulher que ele dormira e acordara com ela, com o cheiro dela, por muitos anos. Era uma falta enorme. Pensava se a ex estava sentindo a mesma sensação vazia que ele. Lera alguns depoimentos na Internet que a separação era um alívio para algumas mulheres. Seria mesmo? Pensou.
Para ele não. Ele acha que os homens sofrem mais.
O celular tocou e ele atendeu, era um amigo convidando-o para jogar truco; ele respondeu que sim. Olhou para lugar onde a mulher estava e não a viu mais. Desceu do carro e olhou os quatro cantos do estacionamento e não a viu definitivamente; talvez o acaso faça reencontrá-la um dia, mas é utópico pensar assim, pode ser que nunca mais a veja. Lembrou-se do velho de “Morte em Veneza”, não sabe muito bem o porquê; mas há um certo sentido, pensou.
Decidiu ir embora, engatou a marcha a ré e saiu devagarinho, mas teve que parar e desligar o motor. Passava uma fila de carros com faros acesos, e cruzes nos para brisas. Era um acompanhamento fúnebre, sem a música do réquiem, encomendada ao Mozart. Mostrando silenciosamente como tudo acaba; se acaba num processo burocrático que resiste aos tempos, que enriquece cartórios e funerárias. Maximiliano pensou: “porque querem mudar tudo e não mudam isso?”
Sua irmã diz que não quer saber de velório quando morrer; quer ser trancada numa sala para cumprir o tempo legal, e depois têm que jogá-la e cobri-la com terra, só, somente.
Por fim passou, passou o desfile ainda sem o coro celestial dos deuses.
Maximiliano pensou: “será que a alma desse defunto está vagando, andando neste estacionamento? Tudo vem a cabeça porque o pensamento é livre e voa, como voam os pássaros.
Maximiliano foi jogar truco com os amigos. Uma das únicas coisas que dependiam da exclusiva vontade dele, e de mais ninguém.

 

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